O professor não é apenas um
comunicador, mas também um modelo. É um símbolo pessoal imediato do processo
educativo, figura com a qual os alunos podem identificar-se e comparar-se. Quem
não se recorda do impacto causado por um determinado professor – um entusiasta,
um disciplinador, autoritário, divertido ou apaixonado pela sua docência. Há
muitas imagens destas, e são preciosas.
Nossa realidade é que a
constituição do professor está intrinsecamente relacionada à formação
profissional que valoriza a formação como conhecimento técnico e de
desenvolvimento de habilidades. Há um distanciamento entre teoria e prática
onde a formação se dá no domínio do conteúdo específico. A formação do
professor têm se apoiado na racionalidade técnica, numa dimensão instrumental
com aplicação rigorosa de teorias e técnicas científicas.
É relevante compreender que o
professor não se constitui somente no hoje de sua formação enquanto aprendiz ou
em serviço, ele participa da construção da história de seu tempo. Na
constituição do professor o individual e o social estão interligados. O que
motiva o professor, incita suas ações e determina sua prática, é um sentido
pessoal que ele dá a atividade exercida a partir de suas experiências vividas e
sua trajetória.
Na constituição do ser professor
estão as questões que envolvem crenças e relações emocionais a partir da
cultura familiar. O campo da formação de formadores não pode limitar-se apenas
às dimensões técnicas e tecnológicas, necessita-se de uma compreensão mais
profunda dos processos através dos quais as pessoas se formam.
A partir de diferentes contextos
encontramos sentidos subjetivos individuais, mas no contexto da
profissionalidade do professor, acabam se configurando sociais e voltam a esses
sujeitos singularizando-os novamente. É impossível separar o eu profissional do
eu pessoal. NÓVOA (1992)
Esses caminhos se cruzam a maneira
de ser com a maneira de ensinar, ou na maneira de ensinar o jeito de ser. “A
maneira como cada um de nós ensina está diretamente dependente daquilo que
somos como pessoa quando exercemos o ensino.” NÓVOA (1992, P.17)
Processos formativos nos mais
diferentes espaços, presentes nas histórias de vida de cada um, fazem parte da
formação de qualquer pessoa e, desse modo, também da constituição do ser
professor trazendo para essa formação as relações sociais e culturais mais
abrangentes em que vive o professor.
Há certas medidas que devem ser tomadas
para melhorar a qualidade dos professores. Melhor educação de base nas
instituições de formação, de conhecimentos e princípios. A formação inicial
deve considerar a bagagem de outros contextos formativos além do ensino formal,
aqueles que vem da infância, das relações familiares e sociais que acabaram
configurando dentro de cada um o modo de ser pessoal e profissional. No
processo histórico cultural tomamos nosso caminho.
A aprendizagem de conceitos e
princípios ocupa um papel fundamental na construção de conhecimentos de um
indivíduo.
Tal aprendizagem se dá tanto em
situações escolares como em atividades e situações que ocorrem fora da sala de
aula, em situações não programadas. Quando falamos em aprendizagem nos
referimos ao processo de aprendizagem e quando nos referimos ao conhecimento é
o produto ou resultado do processo de aprendizagem.
O
conhecimento na ação também pode ser conhecido segundo Habermas (1987) como o
conhecimento técnico de resolução de problemas; ou seja, o saber fazer do
professor, o saber fazer e o saber explicar o que faz. São capacidades
distintas, uma que é o conhecimento e a outra a capacidade que cada professor
utiliza em sua ação. Esse conhecimento o professor já possui mesmo que já tenha
automatizado em suas ações do dia-a-dia.
A reflexão dos professores sobre sua prática ficou
conhecida na década de 90. Mas a epistemologia da prática segundo Shigunov
& Shigunov Neto (2002, p. 320) “[...] teve sua origem em Dewey (1859-1953)
em que a necessidade de formar professores que venham a refletir sobre sua
própria prática, na expectativa de que a reflexão será um instrumento de
desenvolvimento do pensamento na ação.”
A partir do momento em que os professores
aprendem analisar e interpretar a sua própria prática estão realizando a
reflexão-na-ação. Isto acontece no dia-a-dia, quando pensamos sobre o que
fazemos ao mesmo tempo atuamos. Essas reflexões não se baseiam em um único
conhecimento, pois, sobrepõe a elas um segundo conhecimento, isto é, um
processo de diálogo que acontece com a situação problema e sobre uma interação
própria que exige uma intervenção concreta em que segundo (Pérez Gómez, in:
Nóvoa, 1995 p. 104):
[...] encontra-se constrangido pelas pressões
espaciais e temporais e pelas solicitações psicológicas e sociais do cenário em
que atua. È a [...] reflexão sem o
rigor, a sistematização e o distanciamento requeridos pela análise racional,
mas com a riqueza da captação viva e imediata das múltiplas variáveis
intervenientes e com grandeza da improvisação e criação.
A
reflexão na ação e sobre a ação são processos de pensamento que poderão ocorrer
de forma retrospectiva sobre uma situação importante para o estudo e sobre as
reflexões-na-ação produzidas pelo professor.
Nesta perspectiva formação de professores
segundo Zeichener (in Nóvoa, 1995, p. 126) “[...] centrada na investigação
envolve esforços no sentido de encorajar e apoiar as pesquisas dos professores
a partir de suas próprias práticas. O ensino é uma forma de investigação e
experimentação.” È o momento em que o professor para, descreve, analisa e
avalia suas ações e intervenções registradas, ou seja, a reconstrução da ação
desenvolvida anteriormente.
Contudo, o processo de aprendizagem não se
restringe apenas ao “ensino formal” embasado na racionalidade técnica, mas alcança outros campos de
vivências e experiências individuais do professor em diversos espaços
formativos.
A racionalidade técnica opõe-se ao
desenvolvimento de uma práxis reflexiva. É necessário superar o intelectualismo
e democratizar o ensino num processo de construção de saberes não somente
científicos, mas também culturais. As experiências de vida levam o professor a
significar e sentir o modo como trabalha. A maneira como ensinam depende do que
somos como pessoa. As práticas de ensino estão diretamente relacionadas à vida
e à pessoa do professor.
Segundo Darido (2005, p. 11) a construção do conhecimento para Piaget se dá “[...]
a partir da interação do sujeito com o mundo, que extrapola o simples exercício
de ensinar, conhecer se torna sempre uma ação que implica esquemas de
assimilação e acomodação, num processo constante de organização.“ Neste sentido
a assimilação é quando o indivíduo atua sobre o meio transformando-o, adequando
as suas estruturas; e a acomodação é quando o sujeito é modificado para se
ajustar as diferenças impostas pelo meio.
A partir de 1980 o “saber” voltado aos
professores fez surgir várias pesquisas na Europa que foram disseminadas para o
Brasil. Um desses pesquisadores que se destacou foi Maurice Tardif com seus
estudos “Saberes Docentes e Formação Profissional”, em que apresenta sua perspectiva
teórica sobre o assunto, questões relevantes para o entendimento dos saberes
que mobilizam a prática pedagógica dos professores.
O saber está relacionado diretamente com o
contexto do trabalho e os condicionantes que o cerca quando tratamos das profissões
e ofícios. Desta forma Tardif (2002, p.11) coloca que “[...] o saber é sempre o
saber de alguém que trabalha alguma coisa no intuito de realizar um objetivo
qualquer”. Acrescenta ainda, que o saber é concreto e não flutuante isto é:
“[...] o saber dos professores é o saber deles e
está relacionado com a pessoa e a identidade deles, com sua experiência de vida
e com sua história profissional, com as relações com os alunos e com outros
atores escolares na escola, etc.” (p. 11).
O saber do professor também é diversificado ou
como chama Tardif (2002 p. 18) “[...] plural, compósito, heterogêneo, porque
envolve no próprio exercício do trabalho, conhecimentos e um saber-fazer
bastante diversos, provenientes de fontes variadas, e provavelmente de natureza
diferentes.” Desta forma os saberes dos professores não originam de seu
trabalho no dia-a-dia, ou seja, o saber social do professor é patentiado.
Tardif (2002 p.19) exemplifica:
[...] alguns deles provém da família dos
professores, da escola que o formou e de sua cultura pessoal; outros vêm de
universidade e escolas normais; outros estão ligados a instituição programas,
regras, princípios pedagógicos; outros provêm dos pares, dos cursos formação.
Neste sentido o
professor mantém uma relação social com esses grupos que produzem os saberes.
O saber também é
temporal, pois, como diz Tardif (2002, p. 20) “[...] não se limita a história
da escola ou familiar dos professores. Ela também, se aplica á sua carreira
essa comprometida com um processo temporal marcado pela constituição do saber
profissional”. Desta forma os professores vão aprendendo a dominar os saberes
ao longo de sua carreira, ou seja, aprendendo a ensinar.
Tardif vem nos mostrar
em seus estudos o quanto é importante conhecer os saberes que envolvem a
prática pedagógica, e também, vários tipos de saberes existentes como: saberes
docentes, disciplinares, curriculares, experienciais, da formação profissional,
entre outros estudos que não nos cabe discorrer neste momento e sim aprofundar
futuramente na pesquisa que vamos na busca dos saberes dos professores de
Educação Infantil, pois, é na prática pedagógica que se mobiliza diversos
saberes.
A formação de
professores em cursos específicos é inaugurada no Brasil no final do século XIX
com as Escolas Normais destinadas à formação de docentes para as “primeiras
letras”. Essas escolas correspondiam ao nível secundário de então. Devemos
lembrar que nesse período, e ainda por décadas, a oferta de escolarização era
bem escassa no país, destinada a bem poucos. Nos inícios do século XX aparece a
preocupação com a formação de professores para o secundário (correspondendo aos
atuais anos finais do ensino fundamental e ao ensino médio), em cursos
regulares e específicos. A formação desse tipo de professor inicia-se com a
criação de universidades.
Verificou-se que o
processo de oferta dos cursos de licenciatura no país permite inferir que as
condições de formação de professores, de modo geral, ainda estão muito
distantes de serem satisfatórias, e evidencia que a preparação de docentes para
os anos iniciais da escolaridade em nível superior está sendo feita de forma um
tanto precária.
Constata-se nas
instituições de ensino superior que oferecem licenciaturas a ausência de um
perfil profissional claro de professor. Os currículos não se voltam para as
questões ligadas ao campo da prática profissional, seus fundamentos
metodológicos e formas de trabalhar em sala de aula. Continuam a privilegiar
preponderantemente os conhecimentos da área disciplinar em detrimento dos
conhecimentos pedagógicos propriamente ditos.
Merece, ainda, atenção
a enorme lacuna quanto à formação de professores para a educação infantil, uma
vez que se trata do nível inicial da educação básica, que compreende vários
anos de atenção à criança pequena, e que concentra, como já se viu, o maior
percentual de docentes sem formação adequada.
Se a educação é um processo de
humanização, nossa formação não depende apenas de nós, mas da relação com o
outro, nas relações sociais. O homem não nasce homem, mas se torna homem, se
torna e forma pelas relações sociais. Para ser formado precisa ser educado,
portanto educar é produzir no indivíduo seu lado humano. O Homem é resultado do
meio cultural em que foi socializado.
A constituição do professor se dá
por meio dos sentidos subjetivos construídos nos diversos espaços formativos a
partir das histórias de vida dos sujeitos nos contextos formais de ensino, nos
que estão além dos muros da escola e na história de cada um, em casa, na
família, no trabalho e nas relações interpessoais.
Portanto formar o professor está
além das dimensões técnicas e tecnológicas, mas em dimensões que partem das
vivências e experiências presentes nas histórias de vida de cada um. A
constituição do professor vai se construindo pelos sentidos subjetivos dados ao
longo das experiências de sua vida em diversos espaços formativos.
Subjetividade é o processo
representativo de uma forma de constituição do real, caracterizada por sistemas
simbólicos, de significados e de sentido, na experiência humana. GONZALES-REY
(2003)
Educador algum é sujeito de sua
prática se não tem apropriado a sua reflexão, o seu pensamento. Não existe ação
reflexiva que não leve sempre a constatações, descobertas, reparos,
aprofundamentos. E portanto, que não nos leva a transformar algo em nós, nos
outros, na realidade.
Os contextos de formação acabam
caracterizados por diversos espaços formativos histórico-culturais,
compreendidos por fatos de vida, aqui sentidos como aspectos positivos ou
negativos, motivadores ou facilitadores na escolha profissional. Assim vemos
aspectos relacionados a influências familiares, questões políticas, culturais,
econômicas, psicológicas entre outras. “O ser profissional se constitui
historicamente.” FONTANA (2005,P.50)
Enfim, não nos tornamos professores
somente na formação inicial, mas carregamos em nós o que foi formativo das experiências
vividas, fundadoras de nossa subjetividade ao longo de uma trajetória de vida
que constitui valores, princípios, ou seja, o nosso modo de ser e agir no
mundo.
terça-feira, 11 de junho de 2013